Homilia de Dom Sérgio na Solenidade da Imaculada Conceição.

Homilia de Dom Sérgio na Solenidade da Imaculada Conceição.

POSTADO EM 09 de Dezembro de 2015

Image titleHomilia na Solenidade da Imaculada Conceição da Virgem Maria

Catedral Diocesana – Bragança Paulista (SP)

8 de dezembro de 2015


“... Não tenha medo, Maria, porque você encontrou graça junto de Deus!...” (Lc 1,30).


                            Irmãos e Irmãs!

                            A liturgia na solenidade da Imaculada Conceição da Virgem Maria que hoje celebramos, nos apresenta a mulher que encontrou graça diante de Deus, “ bendita entre todas as mulheres” (Lc 1,42), que concebeu, por obra do Espírito Santo, o menino que foi chamado “Filho de Deus” (Lc 1,35b), “Filho do Altíssimo” (Lc1, 28), “aquele cuja misericórdia perdura de geração em geração para aqueles que o temem” (Lc 1,50). A Palavra que ouvimos nos reporta ao novo início, com o resgate da humanidade decaída pela autossuficiência, mas que encontrou graça diante de Deus, no seu Filho, Jesus Cristo, que “reinou sobre a descendência de Jacó, cujo reinado não terá fim” (Lc 1,33). Nele, “nos tornamos herdeiros, fomos predestinados para o louvor da sua glória, nós que esperávamos em Cristo” (Ef 1, 11-12).

                           No dia 8 de dezembro de 1854, o Papa Pio IX, através da Bula Ineffabilis Deus – Inefável Deus – proclamou oficialmente: “No primeiro instante de sua conceição, pela graça e privilégio de Deus todo – poderoso e em consideração aos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, a Virgem Maria foi preservada e isenta de toda mancha do pecado original. Não só. Ela foi cumulada de tantas graças e de tanta perfeição que não se pode imaginar maior depois de Cristo e de Deus”.

                            O que é o pecado original? No centro dessa questão está sempre a pretensão de ser como Deus, ocupar o seu lugar, fazer oposição a Ele, ao seu projeto de vida e liberdade. Assim, o pecado original é o pecado da autossuficiência, do querer ser igual a Deus, a incapacidade de abrir-se a Ele para amá-lo de todo coração como Senhor absoluto e criador de todas as coisas. É o fechamento, o egoísmo que transforma as relações de comunhão, de fraternidade e de cuidado, em relações de dominação, de posse e opressão, tanto entre as pessoas, como com a natureza, nossa casa comum. Essas relações ontem como hoje, atingem tal nível de deterioração que levam o ser humano a se comportar como se o criador não existisse, se colocando no seu lugar, e aí, experimentando a sensação de estar nu, desprotegido, sem perspectiva.

                         “A nudez é a forma que a história encontrou para mostrar que, quando dá livre curso à sede de autossuficiência, o ser humano acaba fragilizado, pois pode devorar seu semelhante ou ser devorado por ele. As relações com Deus, portanto, se tornam de medo e fuga, pois Ele se tornou um inimigo”. Quantos já não se interessam pela presença d’Ele, ou não querem conhecer seu projeto. Parece que Ele não tem nada a ver com a humanidade, com cada um de nós. Autossuficiência que, ganhando espaço, alcança estruturas sociais, políticas e religiosas e continua desfigurando a humanidade.  

                       Refletindo a realidade do pecado original, refletimos a realidade da graça original, que supera todo pecado. Afirma o apóstolo Paulo: “Nele (Cristo), Deus nos escolheu, antes da fundação do mundo, para sermos santos e íntegros diante dele... (Ef 1, 4)”. “Ele cria todos os seres humanos, independentemente de sua futura pertença religiosa, para serem felizes e colaborarem na felicidade dos outros. Essa é a etapa que nos prepara para a comunhão plena com Deus, na vida eterna. Cada homem ou mulher se desenvolve com o tempo, constituindo-se como pessoa no decorrer da existência. Aprende a amar e a ser amado, recebe a fé de outros e a assume como sua. Já pensaram como é fascinante sermos, até a hora da morte, aprendizes da arte de viver? Construímos nossas vidas sob as coordenadas do tempo cronológico e do espaço físico. Somos condicionados pela cultura onde nascemos e vivemos. No processo de aprendizado com a vida, até os erros têm lugar como oportunidade de superação e crescimento. É preciso lembrar que somos marcados pela finitude e isso constitui algo essencial ao ser humano, pois é criatura e não um Deus. Ser finito, limitado pelo tempo e pelo espaço, ao ciclo de vida e de morte, estar condicionado pela cultura, não diz respeito ao pecado, mas ao fato de ser criatura. O que conta na verdade é que somos parte do grande projeto amoroso de Deus, marcados por sua graça, devendo vigorar, entre nós, relações de bondade, acolhida, gratuidade e partilha”.

                    Estamos fazendo o caminho, árduo, longo, buscando superar as forças que ferem a dignidade humana, a natureza. O que não podemos é ficar indiferentes diante dos fundamentalismos religiosos injustificáveis, do terrorismo e guerras ceifando vidas inocentes, emigrações forçadas – verdadeira expatriação, gerando sofrimento e exclusão escandalosa para a humanidade, violência contra a natureza. Na Igreja, fora da Igreja, precisamos nos unir com todos os que buscam superar essas situações.

                  Cremos na vitória da graça de Jesus Cristo, que nos liberta de todas as cadeias (cf. Rm 5,8 e 8,1-4). A “graça original” de Deus, que nos cria e nos salva, é mais forte do que o pecado original e nos anima a superar a condição de pecadores a que estamos submetidos todos os dias.

                    Nossa celebração se reveste hoje de solenidade ainda maior. Em comunhão com o Santo Padre o Papa Francisco e com toda a Igreja, iniciamos o Jubileu Extraordinário da Misericórdia, com a abertura da Porta Santa na Basílica de São Pedro em Roma. O Papa sabe que a festa litúrgica de hoje, “indica o modo de agir de Deus desde os primórdios da nossa história. Depois do pecado de Adão e Eva, Deus não quis deixar a humanidade sozinha e à mercê do mal. Por isso pensou e quis Maria santa e imaculada no amor (cf. Ef 1,4), para que se tornasse a Mãe do Redentor do homem. Perante a gravidade do pecado, Deus responde com a plenitude do perdão. A misericórdia será sempre maior do que qualquer pecado, e ninguém pode colocar um limite ao amor de Deus que perdoa. Na solenidade da Imaculada Conceição, terei a alegria de abrir a Porta Santa. Será então uma porta de misericórdia, onde qualquer pessoa que entre poderá experimentar o amor de Deus que consola, perdoa e dá esperança” (MV, 3).

                   A mãe de Jesus, o crucificado, preparada desde sempre para ser a Arca da Aliança entre Deus e os homens, nos envolva com a doçura do seu olhar e nos acompanhe neste Ano Santo para que possamos redescobrir a alegria da ternura de Deus. Amém. 

+ Sérgio

                                                                  Bispo Diocesano                                                                          

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